“A importância dum lápis e uma caneta na mão de uma criança… e o sopro da imaginação”
O lápis na mão de uma criança não é um mero entretenimento. Os desenhos infantis revelam muito do seu mundo. A psicologia usa-os em testes de avaliação psicológica e como instrumento terapêutico. Através do desenho, as crianças desenvolvem a atenção e a capacidade criativa, mas também exprimem traços de personalidade, emoções contidos, receios silenciados, conflitos familiares.
A revista “Notícias Magazine”, n.º 829, 13 de Abril de 2008 (www.insight.pt) dá-nos as primeiras pistas sobre esta questão.
“Sara tem 12 anos, quer ser desenhista só sonha ter uma profissão de lápis na mão”, relata à Revista Notícias Magazine que “adora desenhar, pegar no lápis e ver figuras aparecer, é quase mágico, os meus colegas estão sempre a pedir que invente personagens com eles”.
Os cadernos da escola estão cheios de cabeças de cavalo, junto aos números das lições. Ando sempre a ver se posso desenhar, as coisas surgem-me na cabeça e a minha mão começa a mandar em mim”. Desenha cavalos, ninfas, fadas, princesas, mas também cria personagens inspiradas na famosa mascote videojogo sonic para oferecer aos colegas da escola.
Na reportagem, a mãe relata que Sara ainda não tinha um ano já fazia bolinhas nunca chegou a rabiscar as folhas todas como faziam os outros bebês.
Celina Almeida diretora da clínica Insight e formadora na área do desenho infantil dá-nos algumas pistas:
No início é a descoberta: “ A criança pega no lápis como em qualquer objeto para explorar. Mas aquele objeto causa-lhe surpresa com ele a criança consegue reproduzir algo, faz um rabisco deixa uma marca na superfície, na folha de papel ou noutro sítio qualquer. O lápis produz um efeito inesperado, vai querer repetir.”Nessa altura há sobretudo um prazer motor é algo mágico a caneta produz um efeito inesperado e vai querer repetir. É a chamada fase dos rabiscos. Tenicamente referido como realismo fortuito.
Dá uma grande vontade em ser capaz de controlar o objeto que faz magias, aqueles traços que ao princípio são muito juntos e sobrepostos e depois separados e ritmados com a adição de pontinhos e tinha curvas. Ainda não são propriamente desenhos, mas rabiscos, grafismos, automatismos. As crianças vêem os adultos ou até os irmãos mais velhos a escrever e sentem necessidade de imitar. Aos três anos é muito frequente gostarem de oferecer os seus desenhos como um rabisco no canto da folha como assinatura ou como uma suposta dedicatória para a pessoa. O desenho começa a tomar forma e a servir como meio de comunicação.
Aos três anos ou mais cedo ainda como acontece com muitas crianças já existe claramente o intuito de desenhar alguma coisa, de representar a realidade de reproduzir algo que ela conhece ou faz parte do seu eu imaginário “um cão, uma casa, uma fada”. É a chamada fase do realismo falhado, em que a criança se esforça por dominar o lápis e transformar um rabisco numa figura identificável. Aí pode começar a surgir a frustração. Celina Almeida, psicoterapeuta acredita que as crianças têm uma capacidade muito grande em encontrar semelhanças entre um rabisco e um objeto e podem ficar frustradas se não descortinarmos o que está lá. Uma linha curva feita ao acaso é um caracol ou outro animal qualquer…nós é que não vemos o que eles veêm. Exercitando a mão, vão exercitando a mão, vão desenvolvendo a capacidade de atenção e memória.
Olhando para um desenho podemos tentar adivinhar a idade da criança. A partir dos quatro/cinco anos entra-se na chamada fase do realismo inteletual que se prolonga até aos seis anos ou sete entra-se na chamada fase do realismo inteletual que se prolonga até aos seis anos ou sete anos conforme as crianças.
Nessa altura, elas fazem questão de desenhar pormenores que, para nós são desnecessários e que frequentemente censuramos como estando a mais. Desenham o coração, o umbigo ou órgãos genitais por cima das roupas, a comida no estômago, o cabelo debaixo do chapéu como se as pessoas fossem transparentes. A criança tem a preocupação de representar o que sabe que existe mesmo que não esteja à vista. De repente, lembram-se de adicionar mais uma pata ao dinossauro ou mais duas rodas ao automóvel. Como se as figuras fossem esborrachadas, espalmadas na folha de papel de modo a poderem ver-se de todos os ângulos. São os chamados rebatimentos que, a par das transparências caraterizam os desenhos nestas idades. Se existe tem de caber no desenho e tem que estar lá. Mais uma vez os adultos não costumam entender essa necessidade das crianças mostram o seu conhecimento e começam a fazer reparos, apontar , a apontar defeitos que, obviamente, não os incentivam a continuar.
Quando as crianças desenham como se fosse uma fotografia entram na fase do realismo visual o que habitualmente acontece por volta dos sete anos.
Desenham como os adolescentes e os adultos. Passam a ter uma exigência estética, quer em combinar tons, usar noções de perspetivas, já não lhes interessa apenas reproduzir com o pormenor a realidade, querem que o desenho seja esteticamente impressivo e apreciado. Infelizmente é a fase em que a maioria das pessoas deixa de desenhar.
A psicoterapeuta define assim quatro fases da evolução do desenho infantil:
Realismo fortuito – a etapa dos rabiscos até aos dois anos.
Realismo falhado – entre os dois e os quatro anos
Realismo Inteletual – entre os cinco e os sete
Realismo Visual – dos sete/oito em diante
A psicoterapeuta esclarece que estas fases são rígidas, há crianças que começam a desenhar mais tarde, a idade pode variar. Primeiro , nem um rabisco, depois os círculos e as figuras ainda pouco definidas, a seguir os desenhos sem noção de perspetiva e com pormenores “mais” e, finalmente, os desenhos “fotográficos” que tentam retratar a realidade como se fosse uma fotografia. Muitos não chegam a aprofundar a última fase… Basta pedir a um adulto que faça um desenho e aí temos a resposta. “mas eu não tenho jeito para desenhar!...”
Será falta de jeito ou falta de ténica ou treino?…
A criança fala através dos desenhos, comunica situação do seu quotidiano, exprime espontaneamente os seus interesses, medos e angústias, revela a noção que tem de si própria e a sua visão do mundo, real ou imaginária. “quando a criança já é capaz de dominar algum automatismo começa a tentar comunicar através do desenho, conta uma história como é frequente dizerem. O desenho passa a ser uma forma de comunicação, um meio onde retratam a alegria, o mal-estar, as dúvidas, as preocupações que possam sentir. “Ao contrário dos adolescentes, as crianças não exprimem o seu mal verbalmente. Se estiverem habituados a desenhar, acabam por comunicar as suas emoções, o seu desconforto através do desenho. Por vezes, as crianças reagem mal às perguntas diretas, sentem que o seu espaço é invadido, ficam mais retraídos e incapazes de responder: porque estás triste? Conta o que se passou? Estás zangado? “As crianças têm um pensamento mágico…Elas pensam se eu não verbalizar as coisas más elas não acontecem…e esquecem o que de mais triste lhes aconteceu…Receiam falar, mas, depois, isso acaba por sair no desenho, fazem, por exemplo, uma grande tempestade, com chuva, trovões e tudo destruído. O mal-estar é transmitido na folha de papel. O desenho pode ser o pretexto para a criança falar do que a preocupa “os pais e os educadores podem aproveitar essa oportunidade sugerindo à criança que fale do que desenhou.
A folha de papel serve como mediador. É um espaço neutro que ajuda a desanuviar a tensão porque a atenção passa a ser centrada no papel. É também um espaço de projeção a criança vai projetar nas figuras que desenha os seus sentimentos e a situação da sua vida. “Por isso é instrumento utilizado por consultores de psicologia”. (ler artigo seguinte)